O estado da teologia eclesiástica no século XVIII, por Eberhard Heinrich Daniel Stosch
§1
Vou dizer algumas palavras sobre o estado atual
da Teologia Eclesiástica, sem a intenção de expor tudo o que deve seu
significativo crescimento à matéria teológica. Certamente, os estudos
brilhantes de homens eruditos, em línguas originais do texto sagrado; nos
preceitos da hermenêutica; em todos os aspectos pertinentes à filologia sacra;
em comentários e observações muito eruditas para uma compreensão mais correta
das Escrituras Sagradas; em todas as partes da filosofia mais avançada e da
história eclesiástica, que foram explicadas e ornamentadas, espalharam uma luz
considerável por toda a teologia dogmática. Contudo, não faltaram aqueles que,
guiados por várias razões, mancharam as doutrinas principais da religião
cristã, reduziram todo o sistema de dogmas de fé a outra forma e se esforçaram
para mudar todo o sistema de acordo com as opiniões de alguns, que até agora
foram consistentemente rejeitadas pelos protestantes.
§2
A origem desta questão deve ser remontada um
pouco mais atrás. Naquela mesma época em que a doutrina do Evangelho, pelo
ministério de Zwinglio, Calvino, Lutero, Melanchton e outros servos eminentes
de Deus, estava sendo purificada das escórias de erros e superstições e
restaurada à sua integridade original, houve aqueles que, confiando
excessivamente em sua própria inteligência, não puderam suportar a sabedoria
oculta de Deus, manifestada no Evangelho, em elevar os homens à suprema
felicidade por meio de Seu Filho unigênito. Eles se esforçaram ao máximo para
reintroduzir antigos erros, há muito tempo rejeitados pela Igreja, como os de
Sabélio, Artemon, Fotino etc.[1] No
entanto, não puderam levantar suas cabeças até o século anterior, quando uma
colheita considerável surgiu, especialmente na Inglaterra e na França[2],
daqueles que, com hostilidade e não sem certa aparência de erudição, atacaram
toda religião ou, pelo menos, aquela revelada por Deus nas Escrituras Sagradas.
Muitos teólogos eruditos e piedosos reprimiram com sucesso os audaciosos
ataques desses críticos, embora alguns tenham preferido de alguma forma
transitar para os campos deles e, esquecidos da grave declaração de São Paulo
de que "a loucura de Deus é mais sábia do que os homens, e a fraqueza de
Deus é mais forte do que os homens", quiseram acomodar a doutrina cristã
ao gosto deles.
§3
Os primeiros a se preocuparem com a reforma da
teologia, cansados das disputas que então agitavam os teólogos, agiram com
grande prudência e moderação. Dirigiram seus esforços principalmente para
mostrar que a religião cristã não ensina nada que contradiga a razão sã[3]. No
entanto, esses estudos dos homens mais eruditos desagradaram a muitos,
sobretudo porque professavam serem alheios a certos dogmas que outros, com toda
a razão, consideravam que deveriam ser explicados de maneira mais compatível
com as Escrituras e a razão, e não completamente rejeitados. Depois, aqueles a
quem alguns deram o nome de latitudinários[4] e que
seguiram em muitos aspectos os ensinamentos de Socino, avançaram mais longe.
Juntaram-se a eles outros, aos quais agradava a ideia de uma indiferença
religiosa[5], seja
geral, seja especial. Finalmente, alguns acharam[6] que
havia apenas uma verdadeira religião para toda a humanidade, a saber, a chamada
religião natural, que, embora exposta mais claramente nas Escrituras do que
pela simples razão, é, no entanto, suficiente, em termos racionais, para
alcançar a salvação eterna. Alguns teólogos mais recentes seguiram essa linha
de pensamento, concluindo que a religião cristã nada mais é do que a religião
natural, transmitida de forma mais plena e certa por Cristo, a quem foram
adicionadas as promessas de remissão dos pecados e vida eterna, mediante a
obediência aos mandamentos de Deus.
§4
Aqueles que assim pensam sobre a religião
cristã, não conciliam suas crenças nem com as Escrituras Sagradas nem com o
sistema doutrinário cristão que até agora prevaleceu entre os protestantes. No
entanto, também há outros que, embora não se afastem em essência da doutrina
aprovada pelos protestantes, acreditam que muitas coisas podem ser explicadas
de maneira mais correta e mais coerente tanto com as Escrituras quanto com a
própria realidade; cujas advertências, a meu ver, não devem ser totalmente negligenciadas.
Portanto, para que tanto as divergências daqueles que se afastam mais da
doutrina protestante quanto os esforços daqueles que desejam apenas emendar
alguns pontos não sejam ignorados pelos meus ouvintes, achei conveniente expor
brevemente essas questões, sem qualquer ódio para com os irmãos dissidentes,
cujos nomes, por essa razão, poupo. Pois é função do teólogo πάντα δοκιμάζειν, καλὸν κατέχειν "testar tudo, reter o que é
bom"; suportar toda divergência com equanimidade; amar os dissidentes e
reverenciar seus méritos.
§5
É uma opinião comum e aprovada por consenso
entre todos os protestantes que as Escrituras Sagradas são o princípio
universal e perfeito da religião cristã, às quais deve ser atribuída fé como
revelação divina por si só. Embora alguns mais recentes não pareçam querer
rejeitá-las completamente, eles ensinam, no entanto, doutrinas que ou minam
completamente esta crença dos protestantes ou, pelo menos, a tornam inútil.
Alguns, rejeitando critérios externos de verdade, prescrevem que nada na
religião cristã deve ser admitido a menos que possa ser deduzido dos critérios
internos e inerentes de verdade da própria matéria, pelo que também excluem
tudo o que é arbitrário e positivo, não distinguindo suficientemente esses dois
conceitos. Outros decretam que deve haver uma dupla abordagem na religião
cristã. Uma seria para uso do povo, que é histórica e se baseia apenas na
autoridade; outra seria filosófica, que demonstra tudo através de razões
evidentes, tiradas da própria natureza e característica das verdades. Disso deduzem
que a primeira abordagem se torna completamente obsoleta e inútil entre aqueles
que possuem o conhecimento filosófico da religião; e que não terá mais lugar
quando todos os indivíduos, sem distinção, tiverem sido desenvolvidos e
formados em uma capacidade intelectual que os torne aptos e adequados para o
conhecimento filosófico das coisas.
§6
Algumas pessoas têm uma visão superficial sobre
a Sagrada Escritura e sua origem e inspiração divina; elas frequentemente
rejeitam ou minimizam os argumentos externos usados para provar isso. Não
aceitam completamente o cânon dos livros sagrados, usado pela Igreja desde o
século II, e propõem submetê-lo a uma nova análise. Além disso, consideram
alguns desses livros como suspeitos ou desejam eliminá-los. Argumentam que o
Antigo Testamento tem utilidade mínima ou nula para os cristãos, e afirmam que
Jesus Cristo e os Apóstolos o utilizaram apenas como argumento dirigido aos
homens. Se demonstram alguma reverência pelas Escrituras tanto do Antigo quanto
do Novo Testamento em outros, tentam interpretar suas imagens como
orientalismos pretensos, representações alegóricas e poéticas.
§7
Aqueles, porém, que aderem à doutrina dos
protestantes sobre a origem divina tanto do Antigo quanto do Novo Testamento, e
consideram isso como um princípio universal da teologia dogmática,
frequentemente ensinam que os livros simbólicos não têm lugar na igreja e que
toda obrigação solene em relação a eles deve ser abolida.
§8
Na doutrina sobre a natureza de Deus e Seus
atributos, embora se baseie nos princípios da razão mesma, há um grande consenso.
No entanto, há dois pontos nos quais alguns julgaram necessário afastar-se da
opinião comum dos teólogos para evitar qualquer apoio à doutrina da satisfação
vicária do Senhor. Um desses pontos é que formam a noção de santidade e justiça
divinas, que parecem estar inteiramente em conformidade com suas próprias
opiniões. O outro ponto é que consideram necessário insistir apenas nas noções
supremas do Senhor, Rei, Legislador e Juiz, rejeitando aqueles usados pela
Sagrada Escritura sobre Deus, e apresentando-O como o Pai mais indulgente de
todos, interpretando isso de tal forma que não hesitam em aplicar a Deus até
mesmo as fraquezas frequentemente encontradas nos pais em relação aos filhos.
§9
Eles rejeitam totalmente o dogma da Trindade,
que foi estabelecido na Igreja desde o Concílio de Niceia I. No entanto, nem
todos os que discordam dele têm a mesma opinião. Alguns admitem três Pessoas,
mas as consideram subordinadas entre si e de uma natureza metafísica que é
inexplicável para as mentes humanas. Outros creem em apenas um Deus Pai, do
qual o Filho e o Espírito Santo foram produzidos, mas de uma maneira tão
inseparável que essas três Pessoas podem corretamente ser chamadas de um único
Deus verdadeiro. Alguns apoiam o Sabelianismo, outros o Arianismo, e ainda
outros o Socinianismo.
§10
A história da criação, conforme transmitida por
Moisés no livro do Gênesis, é considerada por muitos como uma representação
poética desta grande realidade. Outros entendem que o período de seis dias
sucessivos mencionado como dedicado à criação não se refere a dias de vinte e
quatro horas, mas a um intervalo de tempo mais longo, difícil de determinar
precisamente. Além disso, não interpretam Moisés como afirmando que o universo
foi criado sem um começo, existindo eternamente junto com o próprio Deus, mas
sim que o universo foi criado a partir do nada, ou que a terra foi formada
somente então.
§11
Eles não negam totalmente a existência dos
anjos, mas se recusam a atribuir aos dogmas transmitidos por Cristo e pelos
Apóstolos. Consideram que as referências sobre o Diabo e os demônios nas
Sagradas Escrituras estão relacionadas às opiniões filosóficas judaicas
adotadas dos caldeus. Portanto, negam que aqueles que são mencionados nos
relatos evangélicos como possuídos por demônios estejam realmente possuídos por
demônios. Além disso, interpretam de maneira significativamente diferente do
entendimento comum dos teólogos aquilo que é comumente transmitido pela
Escritura sobre o Diabo e os anjos maus.
§12
A história da queda do homem, mencionada por
Moisés em Gênesis 3, muitos negam que deva ser interpretada de maneira literal
e direta. No entanto, não há consenso entre eles quanto à sua interpretação
alegórica. Alguns afirmam que a concupiscência carnal e suas seduções devem ser
apresentadas por meio de uma imagem alegórica. Outros entendem que aqui é
mostrada a origem geral do pecado, que pode ser explicada da mesma maneira
direta, sem nenhum invólucro de alegoria, como é tratado em Tiago 1:14-15. Outros
ainda consideram que não se pode negar que os eventos ocorreram conforme Moisés
descreveu, mas que o diálogo com a serpente deve ser entendido figurativamente,
como os pensamentos que Eva teve consigo mesma. Alguns veem nisso uma
representação poética do evento, como foi apresentado de forma elaborada por
Milton em sua época.
§13
O que até agora prevaleceu nas escolas
teológicas, a doutrina da imputação do pecado de Adão a todos os seus
descendentes, desagrada a muitos. A imputação do ato e sua imediaticidade, que
os antigos símbolos da Igreja Reformada ignoravam, muitos agora repudiam; até
mesmo a própria imputação de culpa universal não é aprovada por todos. Há
também aqueles que, como Pelágio, a quem elogiam profundamente, afirmam que o
pecado de Adão só prejudicou a si mesmo. Aqueles que costumam derivar os
infortúnios desta vida do pecado de Adão propõem que eles sejam resultado da
providência ordinária de Deus para reprimir os pecados.
§14
Sobre o pecado original inerente, muitos têm
diferentes opiniões. Alguns se persuadem de que os bebês nascem tão bons quanto
Adão foi criado por Deus. Outros negam não a corrupção universal da humanidade,
mas a propagação do vício através da geração. Alguns atribuem essa condição a
um mal metafísico exclusivamente; outros a colocam na excessiva inclinação para
aquilo que é agradável aos sentidos. Há também aqueles que rejeitam o modo como
este argumento é comumente tratado nos sistemas teológicos e nos ensinamentos
catequéticos, admitindo alguma mancha genética que, no entanto, não exclui
totalmente a semente das virtudes inatas da natureza humana desde a infância.
§15
Alguns não admitem outras penas pelo pecado além
dos naturais, todas elas corretivas. Mesmo que concedam a possibilidade de
incluir outros fins mais elevados, consideram a correção do pecador como o
principal e último objetivo que Deus pretende alcançar através das penas. A
maior consideração de Deus deve ser dada na determinação das penas individuais,
de acordo com a natureza e a índole de cada pessoa, e qualquer pena que seja,
deve ser definida por Deus de tal forma que este objetivo final seja finalmente
alcançado.
§16
Hoje em dia, a opinião de muitos sobre Jesus
Cristo é que ele foi apenas um homem; no entanto, unido a Deus de tal maneira
que por meio dele, em quem a presença divina sempre esteve presente, Deus mesmo
falou com os homens, andou entre os homens, os ensinou, sendo assim
considerado.
§17
A razão pela qual na Sagrada Escritura o Filho
de Deus é chamado com ênfase singular é entendida por alguns da seguinte
maneira: porque este título foi conferido ao Messias pelos judeus, de onde
ambas as denominações são alternadas (1 João 5:1-5). Outros consideram que a
singularidade dele é devido à sua semelhança com Deus (Colossenses 1:15, João
5:19). Outros ainda afirmam que sua relação com Deus é filial, marcada por amor
e confiança para com Deus Pai, e que ele se regozija no amor paterno de Deus, formando
esses mesmos sentimentos nos crentes em relação a Deus e os estabelecendo na
mesma relação com Deus.
§18
O objetivo da vinda do Senhor, eles afirmam de
forma unânime, foi libertar judeus e gentios da ignorância, dos erros e das
superstições em que estavam miseravelmente imersos, assim como de uma conduta
vã e ímpia, através de uma doutrina melhor. Ele os chamou para a verdade, para
concepções mais corretas sobre Deus e a religião, para um estilo de vida mais
santo, para uma verdadeira tranquilidade de espírito e para a esperança da vida
eterna. Para melhor defender os judeus, eles exageram a condição miserável
deles sob a lei além do que é justo.
§19
O dogma da satisfação vicária realizada pelo
Senhor por meio da obediência e paixões até a morte na cruz é completamente
rejeitado por alguns, afirmando que é desconhecido tanto das Escrituras quanto
dos primeiros doutores da Igreja, e que, de fato, é uma doutrina que destrói
todo conhecimento correto de Deus. Eles remontam a sua origem a Anselmo,
Arcebispo de Cantuária no século XI, cuja opinião obteve aprovação de muitos
doutores da igreja desde então. Alguns aceitam a satisfação vicária do Senhor,
mas excluem a obediência que chamam de ativa. Outros sustentam o contrário,
atribuindo à obediência ativa do Senhor a causa de nossa salvação. Assim, agora
buscam razões muito diferentes daquelas comumente derivadas da satisfação
vicária, como os mais agudos sofrimentos e tristezas que a alma do Senhor
experimentou. De fato, há aqueles para os quais parece estranho crer em outro
fundamento para a sua salvação e felicidade além de suas próprias virtudes, já
que ninguém pode ser considerado bem-aventurado senão por sua própria virtude.
No entanto, nisso mesmo eles mostram que não entendem corretamente a doutrina
da satisfação do Senhor, que está longe de excluir ou diminuir o estudo da
virtude, mas, ao contrário, os leva com argumentos muito fortes a toda virtude,
santidade, devoção para com Deus e a mais cuidadosa imitação das virtudes de
seu Mediador.
§20
Recusam entender que a reconciliação por Cristo
tenha sido feita por Deus, para quem, sendo extremamente amoroso para com os
humanos, não haveria necessidade de reconciliação. Ao invés disso, argumentam
que deve ser entendida em relação aos humanos, que se reconciliam com Deus ao
abandonar o pecado e retornar à obediência e uma vida piedosa e santa, conforme
ensinado por Cristo. Outros acreditam que os Apóstolos apresentaram a morte de
Cristo como um sacrifício para libertar judeus e gentios da falsa opinião de
que Deus perdoa pecados apenas através de um sacrifício vicário de morte. Para
evitar parecerem agir precipitadamente, distorcem a doutrina comum dos teólogos
sobre a reconciliação por Cristo, interpretando-a de forma mais negativa, como
se o supremo Ser só tivesse aspirado a aplacar sua ira contra os humanos por
meio de Cristo, quando, na verdade, a opinião constante e perpétua dos teólogos
é que Deus, conduzido por seu imenso amor pelos humanos, escolheu o meio
adequado para absolver pecadores de seus merecidos castigos, que é compatível
com todas as suas perfeições, e deu seu único Filho como propiciação pelos
pecados.
§21
Eles negam que Cristo nos tenha libertado das
penas dos pecados por sua morte, pois não podem ser removidas por nós. Pois não
há penas arbitrariamente impostas ou positivas para os pecados; portanto, não
pode ser admitido que Cristo aboliu as penas naturais dos pecados por sua
morte, especialmente porque não apenas a experiência testemunha o contrário,
mas também não há libertação delas a não ser através da emenda de vida e
conduta moral.
§22
Portanto, eles querem interpretar nossa
redenção por Jesus Cristo de maneira bastante diferente; entendendo que ela
deve ser compreendida de maneiras distintas para judeus e gentios. Para os
primeiros, a redenção por Cristo inclui a libertação de um serviço escravo e
infrutífero prescrito por Deus através da lei de Moisés, bem como do grande
temor ao Deus severo e implacável, que os afligia continuamente. Também inclui
o terror da morte, onde temiam ser entregues ao poder do Diabo ou de Sammael,
com grande angústia. No entanto, essa redenção não deve ser atribuída tanto à
morte de Cristo, mas sim à sua doutrina, que apresenta a Deus não como um
Senhor rigoroso, mas como um Pai extremamente indulgente, perdoando todos os
pecados, permitindo que se aproximem dele com alegria e confiança, e esperem
qualquer salvação dele. Quanto à redenção dos gentios, que não tinham medo de
punições arbitrariamente impostas, ela é alcançada através de uma melhor
doutrina do Senhor, abolindo a ignorância, a superstição e os vícios,
renovando-os completamente para a virtude e santidade, tornando-os
verdadeiramente felizes e abençoados.
§23
Mas quanto ao desígnio do Senhor, desejam que
ele tenha tido especialmente este fim: que por meio dela, a verdade
completamente salutar das doutrinas ensinadas pelo Senhor seja confirmada de
maneira certa como se por um penhor e selo. E se há aqueles que atribuem
algumas partes dela na redenção dos homens, explicam isso um pouco mais de modo
obscuro, dizendo que não foi feita pelos pecados dos cristãos, mas em relação
aos judeus, para a redenção das transgressões da antiga aliança mosaica; para
confirmar o perdão dos pecados; e no que diz respeito aos gentios, para gerar
neles confiança e amor para com o Deus mais benigno.
§24
Eles concedem o ofício mediador de Cristo nas
funções profética, sacerdotal e real em certo sentido; no entanto, consideram
mais adequado abster-se da maneira divina, que era clara e útil na era dos
Apóstolos, mas agora mais obscura e de uso limitado. Eles não querem que Cristo
seja chamado de Sacerdote pelo nome que comumente se entende, mas apenas
indicar com este termo que ele é o primeiro na administração do reino de Deus
para a salvação dos homens.
§25
Os teólogos contemporâneos têm diversas
opiniões sobre a salvação dos gentios, o que outrora agradou aos Pais da Igreja
e a muitos teólogos. Muitos sustentam que, embora desprovidos do conhecimento
de Cristo, os gentios não devem ser excluídos da salvação, pois aqueles
dedicados a toda virtude e estabelecendo suas vidas de maneira adequada à
religião natural podem eventualmente participar dela. No entanto, alguns
afirmam que isso ocorre exclusivamente pela graça de nosso Senhor Jesus Cristo,
enquanto outros derivam isso da própria virtude e obediência deles.
§26
Para que o homem seja chamado pela mensagem do
Evangelho a se converter e a crer, e diariamente progrida para uma vida melhor
e mais santa, alguns não consideram necessária uma certa virtude interna do
Espírito Santo, mas acreditam ser suficientes as capacidades com as quais a
natureza humana foi dotada, e especialmente útil a virtude moral da Palavra
divina.
§27
Quando definem a fé, a confiança em Cristo como
um Mestre enviado por Deus, consideram que isso só poderia ser tolerado se
claramente não deformasse a noção da doutrina de Jesus Cristo conforme o
Evangelho. Parece ser também a razão pela qual desejam abolir aqueles termos
enfáticos pelos quais a Escritura descreve os efeitos da fé, tais como
regeneração, geração de Deus, justificação, adoção, união com Deus etc.,
considerando-os como alegóricos, místicos, obscuros, pouco definidos,
influenciados por orientalismo, entre outros.
§28
Quando teólogos, e até mesmo as Escrituras e a
própria experiência, convincentemente sustentaram até agora que toda verdadeira
conversão a Deus tem como companheira uma tristeza e dor pelos pecados, pela
qual o velho homem é mortificado; é estimada pela imensa graça de Deus e seu
justo preço; leva o homem ao sentido verdadeiro de alegria em Deus e assim vive
completamente em Deus, alguns modernos desviam desse entendimento ao excluir de
uma verdadeira conversão toda tristeza, especialmente a mais intensa, considerando-a
própria apenas do Antigo Testamento.
§29
O fundamento da justificação do pecador,
segundo a opinião de alguns modernos, não pode ser o mérito de Cristo, que eles
claramente não admitem. Portanto, eles colocam exclusivamente na obediência
prestada ao Evangelho, com diligente estudo da virtude e da piedade.
§30
Eles não querem que as regras transmitidas por
Cristo e pelos Apóstolos sobre como devemos nos formar para toda virtude e
piedade sejam consideradas preceitos, mas sim conselhos de um Pai Amoroso que
aconselha seus filhos sobre como podem se tornar felizes e agradáveis a si
mesmos. Portanto, também desaprovam a denominação de "Servos de Deus"
e a frase "servir a Deus", pois entendem que podem ser usadas com
relação à religião mosaica, mas não à cristã.
§31
Eles negam que os sofrimentos e a morte do
Senhor sejam um verdadeiro sacrifício para expiar os crimes da humanidade. Além
disso, eles explicam a natureza dos sacramentos de maneira diferente daquela
tradicionalmente aceita pelos reformados. Alguns limitam seu uso exclusivamente
à profissão externa da religião cristã. Outros não consideram os sacramentos
tão necessários, sugerindo que disputas e controvérsias sobre eles poderiam ser
suspensas na igreja por algum tempo. Há aqueles que ensinam que os sacramentos
são extremamente úteis porque representam sensorialmente o que a palavra propõe
à mente. No entanto, eles recomendam o batismo apenas sob esse nome, lembrando
que todo ritual solene desse tipo deve lembrar a necessidade de manter a pureza
da mente e a inocência de vida. Quanto à Santa Ceia, eles argumentam que ela
serve para lembrar a morte de Jesus Cristo, que selou essa doutrina. Além
disso, alguns enfatizam que ela estabelece uma comunhão mais estreita entre os
cristãos, formando um único corpo.
§32
Há também aqueles que não hesitam em afirmar
que a igreja de Jesus Cristo, logo após a partida dos Apóstolos desta vida, se
afastou do ensinamento do Senhor e dos Apóstolos, adotando em seu lugar as
opiniões dos filósofos, com as quais os primeiros doutores da igreja foram
alimentados e recomendaram às gerações posteriores. Portanto, para eles, uma
nova reforma tanto doutrinária quanto eclesiástica parece necessária. Se
considerarmos a interpretação erudita dos ensinamentos, que sempre teve uma
considerável influência da filosofia, embora possam ser admitidos com algumas
restrições, é certo que a reforma que propõem não segue as Escrituras, mas sim
ideias próprias ou de outros que discordam da doutrina comum.
§33
Muitos negam que a morte seja uma punição pelo
pecado, mas a derivam da própria natureza humana. Eles aceitam retribuições
após a morte, mas apenas naturais, excluindo as positivas. Alguns afirmam que a
ressurreição dos mortos não deve ser esperada em um único dia e momento, mas
que se refere à transição imediata de qualquer indivíduo após a morte para um
estado de vida subsequente. Outros creem que as almas permanecem em um estado
de sono até o dia do juízo. Para muitos, a ideia de penas eternas para os ímpios
parece improvável ou distante da verdade, uma vez que o verdadeiro propósito
delas é corrigir os ímpios e levá-los de volta à virtude e felicidade.
§34
E estas são as diferenças que pareceram
notáveis no estado atual da teologia eclesiástica. No entanto, a menos que
alguém seja um estranho na história da religião cristã, será fácil reconhecer
que muitas das questões que mencionamos não são novas nem recentemente
concebidas, mas foram propostas há muito tempo por pessoas de várias origens e
foram solidamente refutadas por teólogos eminentes. No entanto, considero
injusto rejeitá-las com desprezo apenas porque diferem da teologia eclesiástica
estabelecida até então, especialmente quando algumas observações mais recentes
são dignas de um exame mais cuidadoso. Apenas através desse exame mais rigoroso
é possível discernir com mais clareza o que nelas é verdadeiro ou falso e
apresentá-lo diante de todos de modo a evitar os perigosos escolhos que
encontramos entre eles. Confesso também sinceramente que muitas dessas
opiniões, especialmente aquelas que dizem respeito à doutrina de Jesus Cristo
como Mediador e Salvador dos homens, e que minam completamente a verdadeira
índole da religião cristã, me são completamente estranhas, pois enquanto a
autoridade das Escrituras Sagradas perdurar, elas não podem subsistir.
§35
Quam é louvável, de fato, é o objetivo que
homens eruditos têm diante de si, de purificar a religião cristã de comentários
humanos e restaurá-la à sua integridade original. No entanto, não raramente
acontece até mesmo com os melhores intelectos que, sendo escravos de
preconceitos ou afetos ignorantes, busquem não a verdade, mas interpretações
próprias ou alheias. Isso, entretanto, desagrada-me profundamente em todos os
aspectos, pois desejam adaptar toda a religião e teologia cristã não à
Escritura, cuja autoridade eles infringem de várias maneiras, mas às opiniões
dos naturalistas, temendo erroneamente que, no final das contas, todos, levados
por seu desdém, acabem marchando para os campos dos incrédulos.
§36
Certamente, a mente de Jesus Cristo e dos
Apóstolos era muito diferente quando explicavam o plano divino de salvação para
a humanidade através de seu Filho unigênito. Eles não se preocupavam muito com
o escândalo que esse mistério de Deus poderia causar aos sábios deste mundo,
nem consideravam isso uma tolice (João 6:41-43, 61-62; 1 Coríntios 1:18-25;
2:6-8). Pelo contrário, eles ensinavam claramente, sem ambiguidade, que essa
sabedoria oculta de Deus não é compreendida pelos sábios deste mundo, mas é revelada
(Mateus 11:25-27; João 6:44-45; 1 Coríntios 2:14; 2 Coríntios 4:3-4). Além
disso, somos ensinados na Sagrada Escritura que os caminhos de Deus não são
julgados pelos caminhos humanos, pois são muito mais elevados para que a mente
humana possa alcançá-los (Isaías 55:8-9; Salmo 147:5; Romanos 11:33-35). Portanto,
não devemos provar esse vínculo de verdades segundo uma razão frágil e fraca,
frequentemente moldada por preconceitos, afetos e concupiscências. Em vez
disso, devemos buscar o entendimento que Deus, a fonte da verdade em sua
Palavra, expõe, e nele todos podem conhecer a plena sabedoria de Deus. Aqueles
que seguem a Deus com humildade de espírito como seu professor e guia para toda
a verdade (Salmo 25:8-9; 1 Coríntios 1:24; Mateus 11:25-27).
STOSCH,
Eberh. Henr. Dan. Institutiones Theologiae Dogmaticae in usum praelectionum
suarum conscripsit et prolegomena de praesenti Theologiae Ecclesiasticae statu
praemisit. Debreczini, 1708
Stosch: Eberhard Heinrich
Daniel St., pregador evangélico, † 1781. St. nasceu
em 16 de março de 1716 em Liebenberg, na Mittelmark, onde seu pai, o futuro
pregador da corte em Potsdam, Ferdinand St., era então pastor. Educado no
Gymnasium Joachimsthalschen em Berlim, estudou teologia em Frankfurt/Oder de
1733 a 1736. Iniciou sua carreira eclesiástica como assistente pastoral em
Jerichow, na Marca, onde esteve de 1741 a 1743. Durante este período, viajou
pela Alemanha, Suíça e Holanda, ampliando significativamente seu círculo de
contatos acadêmicos. Em 1744, tornou-se pastor da comunidade reformada em
Soldin, na Neumark, onde se sentiu muito bem. Em 1748, foi chamado para uma
cátedra na Universidade de Duisburg, obtendo o título de Doutor em Teologia no
mesmo ano. Contudo, em 1749, transferiu-se como professor de teologia para
Frankfurt/Oder, assumindo também em 1755 o cargo de primeiro pregador da
comunidade reformada local. Dois anos depois, casou-se com Maria Causse, filha
de um pregador francês e irmã de um de seus colegas, com quem viveu felizmente
até seu falecimento em 27 de março de 1781. Como teólogo, Stosch é notável por
seu esforço em promover uma compreensão científica do cânon do Antigo e Novo
Testamento, embora tenha produzido pouco em termos de escritos publicados, além
de vários programas em latim. Os títulos de seus programas podem ser
encontrados em Meusel (ver abaixo) e Döring (ver abaixo), incluindo "Introductio
in theologiam dogmaticam" (1778) e "Institutio theologiae
dogmaticae" (1779). [https://www.deutsche-biographie.de/sfz81615.html]
[1] Os principais entre eles são:
Valentino Gentilis, Bernardino Ochino, Paulo Alciato, Lelio Socino, Fausto Socino
etc. Veja JABLONSKI, História da Igreja Recente, Sec. XVI, Seção XVI, p. 11 e
seguintes.
[2] Os nomes de Hobbes, Toland,
Tindal, Bolingbroke, Morgan, Voltaire e muitos outros são bem conhecidos. Veja
LELAND, Resumo dos principais escritos deístas. TRINI, Lexicon dos
Livre-Pensadores. THORSCHMID, Biblioteca dos Livre-Pensadores. JABLONSKI, op.
cit., Sec. XVII, Seção I, §§ XIII-XIV e Sec. XVIII, Seção I, §§ XXVI-XXXV.
[3] Aqui se incluem alguns
eminentes teólogos ingleses, como mencionados por Burnet em "Memórias
Históricas da Grã-Bretanha", Volume I, páginas 373-383: Whitchcot,
Cudworth, Stillingfleet, Patrick, Lloyd etc., que seus adversários quiseram
denegrir com o nome de Latitudinários. Suas opiniões podem ser vistas no livro
"Os Princípios e Práticas de Certos Divinos Moderados da Igreja da
Inglaterra, Abusivamente Chamados de Latitudinários" (Londres, 1670), cujo
autor é Edward Fowler, bispo de Gloucester. Excertos desse livro são
apresentados por Spanheim em "Elementa Controversiae", páginas
652-657. As doutrinas dos arminianos mais recentes são quase idênticas, embora
muitos tenham avançado mais e se aproximado dos socinianos em muitos pontos.
[4] Veja também Arthur Bury,
"Latitudinário Ortodoxo" (Londres, 1697) e Jurieu, "A Religião
do Latitudinário" (Roterdã, 1696).
[5] No século II, Apeles foi
mencionado por Eusébio em "História Eclesiástica", Livro V, Capítulo
XIII, e Agostinho menciona os Rhetorianos em "Heresias", LXXII, que
consideravam todas as seitas cristãs igualmente boas. Entre os mais recentes, a
mesma visão foi defendida por Eric Friedlib (Ludovici) em "Investigação
sobre a Indiferença Religiosa" e Von Loen em "A Única Verdadeira
Religião". Esta visão é estendida a todas as religiões por d'Argens em
"Cartas Judaicas", Volume III, página 43, e por Voltaire, entre
outros.
[6] Há muitos hoje que sustentam
essa opinião. Os princípios dessa religião universal são apresentados por
Herbert de Cherbury em "De Religione Gentilium". Veja também C.
Blount em "Oráculos da Razão" e Tindal em "O Cristianismo tão Antigo
quanto a Criação". Nomes daqueles que adotaram essa visão, embora
frequentemente por diferentes razões, dentro da Igreja Protestante, são bem
conhecidos.
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